
Por Letícia Finamore
Uma das rodas de conversa mais atuais e mais inseridas no tema do 3.° Fliparacatu foi realizada na noite desta sexta-feira, 29 de agosto. Às 19h, o público do Teatro Afonso Arinos recebeu Ana Cristina Braga Martes, Bianca Santana e Jamil Chade para falar sobre “fronteiras interseccionadas”, que abordaram temas como crise migratória, muro de Berlim, genocídio em Gaza, xenofobia, muros e divisões territoriais. O escritor Jeferson Tenório, um dos curadores da terceira edição do Festival, foi o anfitrião da conversa.
A socióloga Ana Cristina iniciou sua fala abordando o próprio termo interseccionalidade, destacando que ele parte da ideia de que as pessoas não são atingidas por uma única forma de opressão, mas por várias sobrepostas. Segundo a pesquisadora, existem feixes, interconexões de pessoas que são, por exemplo, pretas, imigrantes, lésbicas ou com deficiência. Cada uma dessas condições já foge de uma identidade hegemônica, mas quando são somadas, produzem múltiplos preconceitos. Para ela, essas fronteiras não são apenas linhas de separação, mas também de “fricção”, pontos de atrito entre grupos e identidades. Em sua pesquisa, Martes observou ainda como todo imigrante, seja brasileiro em outro país ou estrangeiro no Brasil, precisa constantemente justificar sua presença em um território que não é seu e, ao mesmo tempo, afirmar uma identidade coletiva – nacional e étnico-racial – em uma luta política permanente.
Na sequência, o jornalista Jamil Chade chamou atenção para o caráter artificial das fronteiras. “Não existem fronteiras naturais. Todas são políticas”, afirmou, lembrando que rios e acidentes geográficos só se tornam limites por decisão humana. Ele destacou que, 35 anos depois da queda do Muro de Berlim, nunca houve tantos muros no mundo como hoje. Para Chade, tais construções vão além do caráter de barreiras físicas, construindo realidades psíquicas e revelando os medos de uma sociedade. “O poder no muro é psíquico. Ele é a legitimação institucional da diferença, mas a sombra que produz é feita da mesma escuridão: a intolerância”, disse, citando sua experiência em coberturas de comícios de Donald Trump, nos quais o “diferente” se torna o alvo central da segregação.
Escritora e curadora do Fliparacatu, Bianca Santana trouxe para o debate o pensamento de Sueli Carneiro, de quem escreveu a biografia e cuja instituição chegou a dirigir. Inspirada no livro “Dispositivo de racialidade”, Santana ressaltou como a ideia de “outro” é central na formação das hierarquias sociais brasileiras. Ela lembrou que, no País, as desigualdades raciais se organizam sobretudo a partir do fenótipo – cor da pele, traços e cabelo – mais do que da origem. “No Brasil, mesmo com uma diversidade de autodeclarações – branco, pardo, preto, indígena, amarelo – a experiência do racismo está marcada pela construção de um ‘eu hegemônico’ branco e de um outro negro, que soma pretos e pardos”, destacou. Para ela, ainda que não se tenha vivido uma segregação formal como a dos Estados Unidos, a sociedade brasileira instituiu, ao longo da história, tanto leis quanto “não ditos” que sustentam esse modelo de exclusão.
3.º Fliparacatu
Com uma programação diversa, para todos os públicos, no 3.º Fliparacatu haverá debates literários, lançamentos de livros, contação de histórias para as crianças, prêmio de redação, apresentações musicais, entre outros. O Festival homenageia os escritores Valter Hugo Mãe e Ana Maria Gonçalves e tem a curadoria de Bianca Santana, Jeferson Tenório e Sérgio Abranches.
O 3.º Fliparacatu é patrocinado pela Kinross, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura, e tem apoio da Caixa, da Prefeitura de Paracatu, da Academia de Letras do Noroeste de Minas e parceria de mídia do Amado Mundo.
Serviço:
3.º Festival Literário Internacional de Paracatu – Fliparacatu
De 27 a 31 de agosto, quarta-feira a domingo
Local: programação presencial no Centro Histórico de Paracatu e programação digital no YouTube, Instagram e Facebook – @fliparacatu
Entrada gratuita
Informações para a imprensa:
imprensa@fliparacatu.com.br
Jozane Faleiro – 31 992046367