Por Márcia Cruz

Itamar Vieira Junior, Igiaba Scego e Myriam Scotti abordaram a maneira como memória e imaginação são acionadas na escrita. Os autores conversaram na mesa que encerrou o primeiro dia do 2.º Festival Literário Internacional de Paracatu – Fliparacatu –, nesta quarta-feira, 28 de agosto, no Centro Histórico de Paracatu.

Quem escreve evoca a memória de inúmeras maneiras, pontuou Itamar. No entanto, a memória não está presa ao passado. Os tempos passado, presente e futuro misturam-se na visão do autor de “Torto arado”, criando um contínuo. “A memória é fundamental para que a escrita ficcional aconteça”, destaca. São acionadas a memória macro-histórica quando se refere aos eventos históricos e a memória íntima quando se acessa a subjetividade. A memória é um dos três pilares da ficção. Também está baseada na capacidade do autor de observar, de olhar à sua volta ou voltar-se para o íntimo e para a capacidade humana de imaginar. 

A escritora italiana e somali Igiaba  emocionou-se ao estar pela primeira vez em Minas Gerais. “Grande oportunidade de conexão com o Brasil”, disse ela, admiradora da obra de Caetano Veloso. A memória é fundamental na escrita de Igiaba, como no livro “Cassandra a Mogadíscio”, em que escreve uma carta à sobrinha para contar a história de sua família na Somália. “Minha mãe não queria lembrar nada da guerra [da Somália]. Tentei entrevistá-la. Tentei gravar, mas ela não quis”, revelou. Então, Igiaba viu-se diante da tarefa de abordar o esquecimento da própria mãe, que também era o esquecimento de todo um país, sobre a guerra, um trauma coletivo. A Somália passou por um período de 30 anos de guerra, e a família de Igiaba mudou-se para Roma em 1980. 

Myriam destacou que, em “Terra úmida”, a memória é acionada para tapar os espaços vazios. “Precisei da memória para começar a história e ao mesmo tempo precisei criar. Não era minha vida”, disse. 

Itamar, Igiaba e Myriam também abordaram a felicidade e ela como o tema aparece na literatura. Felicidade foi um dos temas abordados na mesa de Jeferson Tenório, Edney Silvestre e Taiane Santi Martins. Itamar citou o escritor e jornalista Edney Silvestre para definir a escrita: “Não é um processo ingênuo”.  Muitas vezes, o escritor acessa lugares dolorosos, mas as histórias têm múltiplas dimensões: sentimentos bons e não tão bons. “Quando escrevo, nunca sei o que vou sentir. Ao longo da escrita de um romance e de um conto, vou experimentar muitos sentimentos.” 

A escrita é imprevisível para Itamar, que lembrou que o escritor sabe como a história vai começar, mas não sabe como vai terminar. “Esse caminho é maravilhoso. Vamos descobrir o mundo. E essa descoberta é acompanhada de dores. Quero experimentar tudo que a escrita tem a oferecer, seja como leitor, vivo essas sensações, seja como autor que quer experimentar tudo isso.”

A memória é base da literatura de Igiaba, aliás ela destacou que há uma conversa mundial sobre a memória, em especial a memória dos negros. Os territórios dos autores também atravessam as respectivas obras. Igiaba vive em Roma, a memória está em cada canto de uma das cidades mais antigas do mundo. A Amazônia está presente na literatura de Myriam, tal qual o Recôncavo Baiano está presente na obra de Itamar. “Nosso corpo não se dissocia do mundo onde nós vivemos. Carrego muito do lugar que nasci e cresci. Essa também é a experiência das minhas personagens”, disse.  

A literatura, para Itamar, também tem a função de resistir ao que foi negado. “Parto desse lugar onde a miscigenação dessa experiência foi muito celebrada, mas houve muitos apagamentos.” Itamar falou que vem de uma família trirracial, de brancos, negros e indígenas, e como essas diferentes ascendências faz com que haja uma relação com a memória. 

Sobre o Fliparacatu

O 2.º Festival Literário Internacional de Paracatu – Fliparacatu – acontece entre os dias 28 de agosto e 1.º de setembro, com o tema “Amor, Literatura e Diversidade”. A entrada é gratuita para todas as atividades. O Fliparacatu é patrocinado pela Kinross, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura, e tem o apoio da Prefeitura de Paracatu, Academia Paracatuense de Letras e Fundação Casa de Cultura.

Serviço:

2.º Festival Literário Internacional de Paracatu – Fliparacatu
De 28 de agosto a 1.º de setembro, quarta-feira a domingo
Local: programação presencial no Centro Histórico de Paracatu e programação digital no YouTube, Instagram e Facebook – @‌fliparacatu
Entrada gratuita

Informações para a imprensa:

imprensa@fliparacatu.com.br
Jozane Faleiro  – 31 992046367/ Letícia Finamore – 31 982522002