por Gabriel Pinheiro
O escritor Jamil Chade conversou com as escritoras Eliane Marques e Mônica Sifuentes no Auditório Afonso Arinos. O Festival Literário Internacional de Paracatu – Fliparacatu – foi palco de uma conversa contundente que passou por temas como o trabalho doméstico, as histórias invisibilizadas e o papel da ficção histórica na construção de imaginários.
Jamil Chade abriu a conversa refletindo sobre o trabalho doméstico e os direitos deste trabalho: “Mas quais são os direitos das trabalhadoras domésticas? Os mesmos de todos os outros trabalhadores”. Ele relembrou quando tal pauta foi discutida na Organização Internacional do Trabalho – OIT –, numa convenção que tratou do tema: “Escrevendo aquela matéria eu refleti que raramente a gente publica algo e pensa ‘Isso é histórico’”. No dia seguinte à publicação, ele recebeu o contato do jornal informando que, por conta da matéria, estava recebendo um mar de cartas. Não cartas de celebração, mas de pessoas reclamando que, enfim, as trabalhadoras domésticas teriam seus direitos trabalhistas reconhecidos por uma convenção internacional. “A pergunta que me doía era: quem são os meus leitores?”
Na sequência, Chade pediu para Eliane Marques comentar sobre seu novo romance, “Louças de família”, segundo ele, “uma obra que fala sobre a exploração do corpo negro”, e como a ancestralidade se expressa no livro. A autora comentou que cresceu ouvindo que as mulheres de sua família – mãe, tias, avós – iam trabalhar em “casas de família”. “O meu livro traz pro centro da história a voz, os cosmo-sentidos e as histórias dessas mulheres que são ancestrais não só das pessoas negras, mas de todas, pois foram essas mulheres que carregaram esse país nas costas.” Eliana destacou como seu romance busca tirar da invisibilidade as histórias dessas mulheres.
Pegando o gancho da invisibilidade, Jamil pediu para Mônica Sifuentes discorrer sobre seu livro “Um poema para Bárbara”, que resgata a história de uma mulher inconfidente. A escritora comentou como para ela, mesmo na ficção, um escritor deixa um pouco de si naquilo o que escreve, há algo que a tocou ao escolher contar essa história. “A Inconfidência mineira nunca foi contada pelo ponto de vista das mulheres. Ela sempre foi contada tendo como foco dois homens.” Por isso, ela escolhe resgatar essa história pelo ponto de vista de uma mulher que se destacou frente aos seus contemporâneos: Bárbara Heliodora. “Ela conseguiu, num ambiente machista, numa sociedade totalmente patriarcal no século XVIII, ser uma poeta, ler em francês, por exemplo. Às mulheres não era permitido participar das conversas.”
Mônica destacou a importância do romance histórico ao nos permitir conhecer as histórias que nos formaram: “Conhecer a sua história faz com que você, inclusive, resgate a sua autoestima. Acho que esse é o verdadeiro papel do romance histórico”.
Eliane Marques relembrou Maria Firmina dos Reis, uma escritora negra a quem não era permitida a escrita. Por isso, ela teve de escrever sob pseudônimo. Maria Firmina é a primeira romancista negra do Brasil. Jamil perguntou para Eliane sobre a presença das mitologias africanas em seus livros. “É a base da minha literatura”, destacou a escritora.
Ao fim, Mônica Sifuentes declarou: “Eu tenho uma missão de, ao contar a história dos outros, contar a minha própria história. Dentro dessa história da Inconfidência Mineira eu conto a história de todos nós brasileiros”.
O 2.º Festival Literário Internacional de Paracatu – Fliparacatu – acontece entre os dias 28 de agosto e 1.º de setembro, com o tema “Amor, Literatura e Diversidade”. A entrada é gratuita para todas as atividades. O Fliparacatu é patrocinado pela Kinross, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura, e tem o apoio da Prefeitura de Paracatu, Academia Paracatuense de Letras e Fundação Casa de Cultura.