Cortejo de caretagem do grupo quilombola dos Amaros marcou o início do I Fliparacatu (Foto: Ranch Films)

Com significativa adesão da comunidade local e votos de que seja uma semente profícua, o pontapé inicial do primeiro Festival Literário Internacional de Paracatu, o Fliparacatu, foi dado nesta quarta-feira (23) celebrando a arte, a literatura e a ancestralidade. O evento, em sua edição de estreia, homenageia dois grandes nomes da literatura: a brasileira Conceição Evaristo, que já está na cidade, e o moçambicano Mia Couto, cuja presença é aguardada pelo público para uma série de atividades nesta sexta-feira (25).

A programação do Fliparacatu se iniciou ainda pela manhã, com atrações para as crianças. No fim da tarde, aconteceu um cortejo com quilombolas da comunidade dos Amaros. Em seguida, ocorreu o corte de fita, em frente à igreja Nossa Senhora do Rosário, com a presença da escritora Conceição Evaristo, dos curadores do Fliparacatu, Afonso Borges, Tom Farias e Sérgio Abranches, e representantes da Kirnoss, empresa patrocinadora do evento.

Na sequência, os curadores seguiram para uma mesa de bate-papo com o gestor cultural Danilo Miranda, que participou da conversa de forma virtual, que aconteceu no interior da histórica Igreja Nossa Senhora do Rosário – vale registrar que a Diocese de Paracatu abraçou o evento, permitindo que parte da programação se desenrole em espaços como o interior do templo e o Centro Pastoral São Benedito, também conhecido como Casa da Pastoral.

Foi também na igreja que, antes do bate-papo previamente programado, ocorreram uma série de discursos, alguns deles de improviso. Caso das falas de João Candido Portinari, filho de Candido Portinari, que fez um discurso emocionado sobre a luta contra o racismo e a discriminação.

Em uma breve apresentação, ele contou que seu pai convidou dez negros para a sua exposição no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, em 1940, mas nenhum deles pôde entrar por causa da segregação racial nos Estados Unidos. Ele agradeceu ao amigo Afonso Borges, um dos organizadores do Fliparacatu, pela sensibilidade e pela coragem de fazer esse evento, que conta ainda com exposição “Portinari Negro”, que reúne obras do pintor brasileiro que retratam a cultura e a identidade afro-brasileira.

Conceição Evaristo, uma das principais vozes da literatura brasileira, também falou de improviso na abertura do festival. Ela elogiou a iniciativa de Borges, saudando-o por sua luta pela cultura, pelos livros, pela democratização da cultura e pela democracia do livro. Ela também destacou a importância de Paracatu como um lugar de resistência e de expressão da cultura negra no Brasil – a cidade possui a maior população quilombola do Triângulo, Alto Paranaíba e Noroeste de Minas, e é a 10ª no ranking em todo o estado.

Ovacionada, a escritora falou sobre a necessidade de se pensar numa nação justa, que reconheça a potência e a diversidade da sua identidade. Ela criticou o fato de a sociedade  brasileira ainda repetir os lugares identitários e subalternizar determinadas identidades. Em seguida, pontuou que a cultura tem o poder de atenuar e modificar essas mazelas, dizendo, por fim, que a literatura e a arte são lugares que permitem e promovem essa modificação.

Após a série de falas iniciais, João Candido Portinari deu sequência à programação do dia ministrando uma palestra sobre Candido Portinari, na Casa Pastoral. Ele falou sobre a vida e a obra do pintor brasileiro, que retratou o povo e a cultura do país em suas telas.

Patrocinado pela Kinross, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura, com o apoio da Prefeitura Municipal de Paracatu, da Paróquia de Santo Antônio e do Projeto Portinari, o Fliparacatu segue até domingo com uma programação gratuita e variada, que inclui mesas, palestras, oficinas, shows e outras atrações. Entre os convidados estão nomes consagrados da literatura nacional e internacional, como o moçambicano Mia Couto, o português José Luís Peixoto, os brasileiros Itamar Vieira Junior, Jeferson Tenório, Eliana Alves Cruz, entre outros. A estimativa é que 30 mil pessoas participem do festival.

*O repórter viajou a convite da Kinross, patrocinadora do Fliparacatu por meio da Lei Rouanet do Ministério da Cultura.

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